
Então, trago um trecho de um artigo que fiz a 2 anos atrás que retrata um pouco da relação dos jogos e brincadeiras populares com a Educação Física.
Boa leitura...
Falar
de jogos e brincadeiras populares nos faz voltar no tempo, lembrar de como era
bom sair de casa, muitas vezes escondidos e sem autorização dos
nossos pais, e correr na rua, brincar de pular corda, amarelinha, jogar bolinha
de gude, polícia ladrão, pega-pega, toca, queimada, andar de bicicleta,
construindo casas com cobertores e cadeiras, escorregando de meia pela casa e outras tantas brincadeiras.
Os jogos e as brincadeiras infantis e a Educação Física
Antes de recorrermos aos benefícios
do jogo e brincadeiras nas escolas, vamos fazer um questionamento. O que é o
jogo? Como podemos definir esta palavra que traz um imenso repertório lúdico? Para Lorezoni (2002)
há uma diferença entre jogo e brincadeira. Diz o autor que “o jogo é uma
brincadeira com regras e a brincadeira, um jogo sem regras” e que “o jogo se
origina do brincar ao mesmo tempo em que é o brincar” (LOREZONI, 2002, p.53).
Kishimoto (1999) afirma que tentar definir o termo jogo
não é tarefa fácil, pois quando se pronuncia a palavra jogo cada um pode
entendê-la de modo diferente, pois uma mesma conduta pode se tornar jogo ou
não-jogo em diferentes culturas. Pode-se falar de jogo de adultos, de crianças,
de amarelinha, xadrez, contar estórias, brincar de mamãe e filhinha, futebol,
dominó, quebra-cabeça e uma infinidade de outros. No entanto, cada um destes
apresenta suas próprias especificidades e vai depender do significado que cada
cultura atribui ao mesmo.
Ela ainda diz que a concepção de jogo não pode ser vista
de modo simplista, mas pelo significado da aplicação de uma experiência,
instrumentalizada pela cultura da sociedade. Isso significa que quando alguém
joga, está ao mesmo tempo desenvolvendo uma atividade lúdica. Neste contexto
podemos observar uma relação íntima entre atividade física e prazer.
Ao mesmo tempo, Huizinga (2000, p.33) propõe a seguinte
definição para o jogo:
“[...] uma atividade de
ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo
e de espaço, seguindo regras livremente consentidas, mas absolutamente
obrigatórias dotadas de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de
tensão e alegria e de uma consciência de ser diferente da vida cotidiana.
Para Huizinga (2000) um dos
elos linguísticos mais importantes é o jogo: “o jogo é o um fato mais antigo que a cultura, pois pressupõe
sempre a sociedade humana, ultrapassa os limites da atividade puramente física
ou biológica e confere um sentido a ação” (HUIZINGA, 2000, p.03-04). Isso nos
indica que o jogo é um fator essencial para o desenvolvimento da criança,
deixando um domínio lúdico. Nela, está sustentada a necessidade do jogo como
fonte de prazer e criação.
Os
jogos e as brincadeiras populares fazem parte da cultura infantil e podem ser
praticados nas ruas, quintais, pátio das escolas, terrenos baldios, áreas de
lazer, ou seja, onde quer que existam espaços disponíveis para sua prática.
No Brasil, os jogos de rua e de
salão têm variações locais, dependendo das influências que cada área recebeu.
No interior dos estados brasileiros, nas cidades ditas como pacatas, ainda
podemos encontrar crianças nos seus quintais confeccionando seus próprios
brinquedos, geralmente são as crianças cujos pais não têm um maior poder
aquisitivo.
Vygotski (1988, p.51) indica que “a relevância de brinquedos e
brincadeiras são como indispensáveis para a criação da situação imaginária”.
Assim, revela que “o imaginário só se desenvolve quando se dispõe de
experiências que se reorganizam”. Desta forma podemos dizer que a riqueza e o
acervo de brincadeiras constituirão o banco de dados de imagens culturais
utilizados nas situações interativas.
O Brasil tem uma enorme diversidade cultural e isso nos possibilita
trabalhar com os jogos de diferentes formas nas escolas. Na obra do Coletivo de Autores (1992) existe uma
preocupação com a localização e a identidade da comunidade escolar, destacando que um resgate dos jogos infantis na
escola suscitaria esse compromisso:
Num
programa de jogos para as diversas séries, é importante que os conteúdos dos
mesmos sejam selecionados, considerando a memória lúdica da comunidade em que o
aluno vive e oferecendo-lhe ainda o conhecimento dos jogos das diversas regiões
brasileiras e de outros países (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p.67).
Quando a criança joga, ela
sai de um mundo concreto e vai para um mundo imaginário, onde lá ela pode criar
suas próprias regras, resultando num processo criativo para modificar a
realidade e o presente. O jogo satisfaz necessidades das crianças,
especialmente a necessidade de ação. Para “entender
o avanço da criança no seu desenvolvimento, o professor deve conhecer quais as
motivações, tendências e incentivos que a colocam em ação (COLETIVO DE AUTORES,
1992, p.66).
Não sendo o jogo aspecto
dominante da infância, ele deve ser entendido como “fator de desenvolvimento”
por estimular a criança no exercício do pensamento, que pode desvincular-se das
situações reais e levá-la a agir independentemente do que ela vê.
Marcellino (2002) pressupõe que com o aumento da
população urbana deixou-se de desenvolver uma adequada infra - estrutura que
zelasse pelo lazer das pessoas. Em consequência, uma preocupação marcante, é o
fato de haver cada vez menos locais onde as crianças possam expressar suas
ações de brincar. Por outro lado Melo (1989) afirma que o avanço tecnológico
dos meios de comunicação de massa, especialmente a televisão, levou a população
infantil a modificar suas formas lúdicas. Como se pode constatar na seguinte
afirmação de Melo (1989):
O repertório de movimentos
foi amplamente reduzido, com a criança passando a desempenhar papel passivo
diante de um receptor de televisão. O problema é ainda agravado pela
transmissão de programas de questionável valor educativo (MELO, 1989, p.74).
Segundo Mello (1999), enquanto na sociedade industrial
tivemos a substituição da atividade humana pela máquina, agora, verificamos a
substituição do raciocínio humano pelos poderes eletrônicos da computação. As
crianças, assim, perderam todo seu poder criativo de se emanciparem enquanto
sujeitos para serem absorvidas pelo computador. Outra dificuldade que se
observa para a preservação de jogos e brincadeiras infantis, de acordo com Melo
(1989), diz respeito ao crescente número de brinquedos industrializados.
Há algum tempo as pipas e os carrinhos estão sendo
substituídos por aviões e carros com controles remotos, as indústrias a cada
dia que passa lançam brinquedos cada vez mais sofisticados, limitando assim a reflexão da criança. Neste sentido, Oliveira (1987)
salienta que a sociedade capitalista, cuja organização está baseada na produção
e no consumo de mercadorias, discrimina os brinquedos artesanais,
confeccionados geralmente por quem brinca, adestrando as crianças a consumir
produtos industrializados.
Vivemos em um país que apresenta uma grande diversidade cultural, sendo
assim, é questionável o que leva a criança a não usufruir das diversas formas
de manifestações que o Brasil oferece. Por exemplo, temos infinitas formas de
expressão corporal, cantigas de roda, jogos e brincadeiras populares, capoeira,
que cada vez mais, estão saindo do cotidiano devido à tecnologia estar presente
em nosso meio, limitando as crianças a seus quartos que lá poderão apenas
usufruir de jogos de computadores, vídeo games e programas de Tv.
Podemos, também, dar relevância a violência que cresce em nossas cidades
e o crescimento destas que tomam os espaços de lazer e o crescimento da
poluição, isso leva os pais a acharem que as crianças dentro de suas casas
estão mais seguras esquecendo o universo lúdico que está ao seu alcance.
Faria Júnior
(1996, p.59) afirma que os “jogos
populares infantis, brinquedos cantados foram sendo perdidos (ou transformados)
nos últimos cinquenta anos possivelmente como consequência dos processos de
urbanização e de industrialização”.
Através da Educação Física que
trabalha com a ludicidade de diferentes formas de manifestações, pode-se levar
as brincadeiras antigas que fazem parte do universo infantil ao cotidiano das
aulas. Através das brincadeiras a criança
movimenta-se em busca de parceria e de exploração de objetos; comunica-se com
seus pares; se expressa através de múltiplas linguagens; descobre regras e toma
decisões.
Trabalhando com estes conteúdos
podemos formar seres críticos, criativos e aptos a tomar decisões. Para isso
podemos usar os jogos e brincadeiras populares no cotidiano das aulas de
Educação Física, algo que será possível em nossas aulas para resgatar a cultura
popular brasileira.